Arquivo do mês: março 2013

Jesus Cristo é o senhor?


Parando pra pensar e revisar os temas de meus últimos textos aqui, vejo que o assunto religião tem frequentado direta ou indiretamente minhas tortas e tortuosas linhas. E eu, que tô longe de ser Deus, portanto, não tendo mesmo a pretensão de escrever certo, preciso novamente me dedicar a isso.

Tenho visto circularem protestos/respostas inflamadas contra a bancada evangélica, numa linha “O estado é laico”, “Discutam política e não religião”, “Isso é um congresso, não uma igreja” e por aí vai… Preocupante! Ora, pra quem não sabe, sou ateu (não posso dizer que de pai e mãe certamente, sendo filho de uma kardecista e dum católico de fato praticante) e, portanto, “neutro” (como se houvesse neutralidade neste mundo… Ó, Brecht, me perdoe por essa) neste ponto. Vejo dois probleminhas (que de pequenos nada têm) nisso tudo. Primeiro, e já citei isso noutro texto (Conclaves, entraves…), a generalização antievangélica que cria o mesmo pressuposto de estereotipação que tanto se combate no discurso de intolerância às chamadas minorias. Depois, a ideia autoritária (sim, autoritaríssima!) de se estabelecer uma censura nos espaços políticos. Pelamordideus (olha Ele aí, gente!)! A própria discussão política tem que criar suas pautas. É assim que funciona. É duma arrogância, já realizada a eleição, dizer que esta ou aquela representação não merece voz! Gostemos ou não (e eu não gosto nem um tiquinho!), essa criticada representação e suas intervenções refletem o pensar e querer duma porção não desprezível de brasileiros. São obscurantistas, temerários, inquietantes, mas também o são vários discursos que lhes tentam dar respostas num reativismo simplista e, por que não dizer, bolante.

É preciso, enfim, ideologizar o discurso acerca dessa questão. Afinal, a mercantilização da fé é pra lá de coerente na sociedade em que vivemos, não? O que se tem, em grande volume, na base desse processo, são trabalhadores desvalidos, em tudo depreciados e marginalizados pelo próprio capital. O dízimo é até barato. Numa vida de agrura e desespero, qual o preço justo pra esperança?

Ah… já que me reivindiquei ateu, é preciso falar um pouco dum certo ateísmo esclarecido que tem graçado por aí… Algo do tipo “Nossa! Como eu sou ateu! Como é inteligente e superior ser ateu!”. E como em meio ao pensamento de esquerda esse modus operandi é difundido! Bem, costumo dizer que não sou ateu em contraposição ao cristianismo. Sou ateu pela impossibilidade total de crer em qualquer coisa além da materialidade do mundo. Isso não visa a agredir ninguém. Na graduação, por um ano e meio pesquisei Mitologia, área quase inexistente no Brasil e que estuda os complexos míticos humanos. Foi uma experiência muito rica pra me ajudar a organizar meu pensamento sobre religião. Costumo dizer que Afrodite, Deus, Thor pra mim estão no mesmo rigoroso patamar. Isso, às vezes, choca os teístas. Mas se trata exatamente disto. Acredito tanto em Deus quanto um cristão crê em Apolo. É tudo mitologia no fim das contas. E não há qualquer sentido depreciativo na utilização que faço do termo mitologia. A arrogância, sobretudo dos grandes complexos míticos monoteístas− cristianismo, judaísmo e islamismo− é que atribuiu percepção pejorativa a esse termo. Sempre lembro que Sócrates foi morto por ser ateu. Ou seja, quando historicizamos essas crenças, vistas prosaicamente como meras “mitologias”, no sentido mais depreciativo possível, encontramos sempre pontos em que elas foram institucionalizadas e “pra valer”.

Dito isso, tenho plena consciência de que ser ateu leva a uma dupla possibilidade de interpretação: ser contra as crenças de base religiosa ou lhes ser indiferente (na óbvia medida do possível, dada todas as situações de interação social ampla que as inclui direta ou indiretamente) [Essa ambiguidade vem do próprio prefixo –a grego que tanto poderia atribuir a ideia de negação quanto a de privação, sinônimas, inclusive, em tantos contextos]. Me vejo claramente no segundo grupo. Sou do tipo que em formulários, quando do preenchimento do item religião (sinistro um formulário qualquer que questione isso, não?) ponho sem religião, pois que não me passa pela cabeça preencher ateu, tal qual fosse isso uma crença também religiosa. É justamente uma impossibilidade de crença. Dependendo do grau de flexibilidade do formulário posso preencher jedi. Acredito muito mais na Força do que em qualquer proposição religiosa outra. Lembro duma amiga me questionando sobre isso e dizendo que era absurdo porque o Mestre Yoda e tudo mais era criação de um homem. Virei pra ela, olhei-a candidamente e disse “É mesmo? Então, foi um ser humano que criou as histórias de Guerra nas Estrelas?! E que outras histórias sobre crenças no incompreensível o ser humano criou?”. Em tempo, no Reino Unido, o jedaísmo é a quarta maior crença religiosa! Já pensaram que, no caso duma hecatombe, se outra civilização descobrisse vestígios de nós, poderia interpretar o jedaísmo como religião de culto pleno? Viajante?! Será?!

Então, é isso. Sou ateu com três pequenas exceções: a Força jedi (já explicada), São Judas Tadeu (afinal, ele é protetor do Mengão) e Bastet (a deusa-gato dos egípcios.). Salvo isso, sou convicta e irreversivelmente ateu. E tenho a consciência que o debate entre ateus e teístas não tem resolução prática. Nem agora nem daqui a sei lá quanto tempo (já tô projetando séculos pra frente…). Mesmo que a Física consiga unificar a relatividade com a mecânica quântica produzindo a propalada Teoria do Tudo, ainda haverá espaço pra se buscar conforto e acolhimento no inexplicável. E como ninguém vai voltar da morte com essa resposta, sigo ateu, mas, torcendo que, caso exista algum deus, que ele não seja revanchista e tenha senso de humor. Sabe-se lá, né?

O que tô tentando dizer, desde o início do texto é que precisamos ter espaço pras muitas crenças ou descrenças, com tolerância plena. Voltando à questão da contraofensiva à representação parlamentar evangélica, não dá pra encurtar ou simplificar as coisas pelo ímpeto de reação. Não dá pra praticar intolerância pra se combater intolerância. Simples assim.

100% de tolerância é por aí...

100% de tolerância é por aí…

Nessa semana, tivemos uma data que deveria ser consagrada à luta contra a intolerância. Em 28 de março de 1431, ironicamente e com trocadilho e tudo, depois de Cristo, foram proferidas as 70 (!!!) acusações que levaram Joana D’Arc ao martírio na fogueira.

Fica aqui uma reflexão sobre algo que os mutantes já sentem há tempos na pele.

Imagem

Piadinha ateia:

− Jesus Cristo é o senhor?

− Não. Sou eu não, mas pergunta pra aquele cara ali da frente. De repente, é ele.

E concluo com a frase que sempre encerra minhas provas: Que a Força esteja com vocês!

Imagem

Categorias: Reflexões, Sociedade | Tags: , , , | 14 Comentários

Da série quantas vidas vivendo por aí (2)


Sardinhas do Joe Best

Sardinhas do Joe Best

Por Ana Souto*

“Quer saber? Ele é um ma-ni-pu-la-dor”. Ela cospe as sílabas como pedrinhas no feijão, mas no prato só tem folhinhas de salada e um pedaço de peixe grelhado. A menina tem que sobreviver a um dia a dia hard na dieta light, atendendo dois telefonemas a cada 15 minutos, além de tudo. “Oi, não.. tô jantando com uma amiga, fala.” Eu descobri que tinha ficado velha quando voltei ao Brasil e percebi que o fato das pessoas interromperem a conversa sem a menor cerimônia me deixava com rugas na testa. Ao vivo ou remotamente. Você está lá conversando com alguém e o seu amigo ou do alguém aparece e não vacila: pula entre os interlocutores e começa a falar. Sem contar que praticamente todo mundo interrompe qualquer diálogo pra atender ao celular. “Desculpa, fala, era a minha irmã, ela está surtada”. Brinco que estamos todos em surto de dependência de comunicação eletrônica. Ela sorri com o olhar vazio, depois parece perceber que tem algo a ver com a máquina da qual não tira os olhos e ameaça uma justificativa. Tudo bem, eu lhe digo, somos mesmo escravos do telefone “Desculpa, fala.” ela diz de olhos baixos, não sei se para pensar no que eu disse ou para não perder a tela do aparelho de vista. Depois me encara e pergunta o que eu acho. Então digo que essa história com seu namorado parece complicada de verdade. Fico sem jeito de confessar que estou pensando em Anna Karenina e Madame Bovary. Só na minha mente doentia uma garota de 23 anos poderia parecer com uma personagem do Século XIX. “Eu acho que você, com a sua experiência pode me ajudar…”. Digo que não é tanta assim, tento ganhar tempo pedindo ao garçom uma tónica com bastante limão e pouco gelo. “Com a minha mãe não dá pra conversar. Ela é daquele jeito, você sabe, uma neurótica”. Digo que é possível gostar de bebidas amargas, quer provar? Ela agradece e leva um pedaço de peixe à boca tão pequeno que não tem de mastigar. Minha mãe, ela quase geme, só se queixa e me critica. As coisas passam, digo a ela, tudo passa, também como um pedido de clemência. Tivesse menos pudor, ia dizer: deixe-me passar sem essa, minha jovem amiga, tudo passa. Mas a aflição dela não quer passar, não antes de fazer a pergunta que me atormenta desde que veio o cardápio. “Você acha que ele me ama?”. Como eu temia, ela quer uma resposta pragmática e direta. Só uma resposta prática interessa. Definitiva?

Acho, em minha cabeça, dezenas de histórias parecidas, ficcionais, vistas e ouvidas. Não, não vou falar das vividas. Acho, minha amiga, que o amor nos tempos de pouco tempo e muita competição, disputa com a paixão o topo no pódio da Maratona de Santa Felicidade. Maratona que não existe porque não há como canonizar um sentimento que são flores ocasionais do caminho e não uma santa para quem se deva acender velas. Acho também que a felicidade, o amor, a paixão só existem como substantivos para dar assunto aos poetas. Acho que na vida mesmo, na carne e nos caminhos, só existem como verbo de práticas, das comunhões do dia a dia: amar, apaixonar, ficar feliz. Todos flexionáveis para o si e para o outro. Todos podendo ser praticados como dança ou como luta. Isso tudo eu simplesmente acho. O que sei é que manipular e manipulador são destas palavras que entram na moda de vez em quando, como os saltos Luiz XV, que nem todo mundo sabe usar. E veja que interessante, minha jovem amiga: é um verbo que, antes de tudo, se aplica ao mundo material. Manipular, diz o meu dicionário mais antigo, é manusear, manejar, preparar manualmente, misturando, certos elementos químicos. Não dá pra imaginar que este verbo pode ter sido criado para indicar a lida de velhos ceramistas e só depois dos alquimistas sonharem a química, adquiriu o sentido que lhe dão as farmácias, hoje em dia? E que o sentido deste verbo, tão bom para descrever a concreta ação das mãos, virou metáfora de humano-sobre-humano só depois que a filosofia saiu das torres de marfim? Sem falar que provavelmente só virou sintoma depois que a psicologia caiu no gosto popular. Será que agora ameaça virar rótulo que se cola às pessoas, como elas fossem frascos na prateleira, aos quais se pode determinar em laboratório com precisão matemática, o que contêm, quanto e de quê?

Ela parece supor na minha hesitação a falta de elementos para responder à pergunta fatal. “Olha só o que ele me disse:”. E prossegue, com seu talento para o teatro e para a contação de histórias, me provendo de farto repertório de diálogos.

Enquanto isto, outro diálogo imaginário se desenvolve na minha cabeça. “Você se lembra daquele livro que lhe indiquei, que falava sobre reificação, a palavra que você não conhecia? Uma pena que você não leu. Ah, eu não tive tempo, mestra… Pois é, mas só podemos trocar ideias sobre o sentido das palavras, quando estamos de acordo quanto a algum significado mínimo comum. Eu queria, neste momento, poder falar com você sobre esta palavra: reificação. Eu acho que seria tão bom se pudéssemos falar de como a vida, que sentimos como nossa e de mais ninguém, se confunde com as dos outros, nos modos de viver que existem, antes mesmo de sabermos dizer mamãe, eu, amor. Eu acho que a gente ia acabar por explorar os muitos sentidos de palavras como amor, eu e mamãe. Eu acho até que íamos nos divertir mais do que falando do que ele-disse-ela-disse, como a se a vida fosse uma telenovela e a medida de todas as coisas fosse o sentido e o ressentido.”

Mas isso tudo eu só pensei e não disse. Porque a menina é jovem e tem direito a não ser importunada por uma velha professora com ideias antiquadas. E porque não quero ser como sua mãe, a criticá-la, e porque às vezes eu também tenho preguiça de enfrentar questões que não têm respostas simples. E talvez aquilo que nela me pareceu preguiça, tenha provocado um mimetismo de letargia, que me impediu de mover a mó da poesia, a ver se podíamos fazer as palavras andarem onde o verbo simples ou composto não alcançam. E veja como às vezes as coisas não são nada simples, minha amiga. Seus gestos seguintes parecem dizer que a única resposta que pude dar a deixou frustrada. Suas atitudes parecem me dizer que talvez não lhe interesse mais nossa amizade, mas continuo solidária a você, pensando nas suas dores, esperando que este não tenha sido o último de nossos jantares, que vamos sarar da falta de tempo, nos encontrar mais vezes, mesmo que seja apenas pelo prazer da companhia, de experimentar esta coisa misteriosa de conviver. Gosto de imaginar que insistiremos em nos ver, mesmo que alguns encontros sejam menos felizes que outros e que eu não tenha nada mais a lhe dizer do que: não sei. Eu quero. Decida se quer e me diga, mas só quando tiver a resposta. E, agora me ocorreu – será que não poderíamos chamar também a esta simples decisão, a prática do amor?

*Ana Souto é nossa convidada de sempre. E não se faz de rogada. Sempre com a gente. Toda a gente. Daqui a pouco é colunista, vira artista e nem sente!

Transverse conosco também. Não vai fazer mal a ninguém.

Categorias: Cultura, Reflexões | Deixe um comentário

Mulheres ao som do tamborzão


Mulher vetor, de Leandro Belo.

Diante do painel das figuras femininas cantadas e cantoras ao som do tamborzão, podemos perceber as mudanças de visão de mundo presentes na sociedade e, porque não dizer, as diferentes percepções da mulher e sobre a mulher nos campos sexual e afetivo.

Nos anos 90, a princesa, a morena, a menina musa do verão, a gatinha, era cortejada, elogiada. O jogo da sedução começava com vamos nos encontrar logo mais, amor eterno, até casamento. Era preciso mostrar que o flerte era apenas o primeiro passo de algo que se pretendia sério, porque durável, sincero, especial. Parte mais lúdica e idílica que erótica. Prometer e comprometer-se (será mesmo?) faziam parte da estratégia de conquista.

casal negro 4

A geração 00 nos pegou com cerol na mão, aparando pela rabiola, repleta de bondes lúbricos, que dançavam o duplo sentido viscoso. Vem, me chama de tchutchuca, de cachorra e me mostra quem é tigrão. Um tapinha não dói. Nada de amor, nada de sentimentalismo barato. Só o ato, o ato, o ato. Frenético, violento, animal, corrosivo. De fazer corar o Michael Douglas.

Imagem

Meados de 2000, a voz feminina sobrepõe-se ao corpo para falar de desejos. Não mais dançarina figurante, não mais dublê de bonde. Agora dona de sua voz, dona dos seus prazeres, boladona, boladona, ela investe, ela desperta, ela balança o coreto, ela manda: demole meu barraco. Não quer ter propriedade sobre o outro, também não quer que lhe botem o cabresto. Amor livre, relacionamentos abertos, é a Regina Navarro das massas.

Imagem

Na outra ponta do cabo e com o membro permanentemente em riste, o Mr. incensa a liberdade sexual, desde que ele dite as regras do jogo. Não gostou? Coloca um chip no meu pau. O bagulho é sério. Vai rolar um adultério. Passa nela, passa nela. Soca, empina, puxa, agita, sobe, desce, mexe, treme, goza. A satisfação feminina demonstra não a preocupação com o prazer alheio, mas a afirmação de seu papel de homem bom de cama, além, é claro, da exigência de uma performance feminina digna de aulas de spinning e body pump. Tão canalha, porque reside na mera perpetuação do papel de macho dominador, como reafirmação do falo patriarcal.

Imagem

Mais modernamente frequentadores das pistas de batidão dançam ao som de dois tipos de hits: de um lado, o som mais seco, mais funkão com elogio desbragado à moça livre que é baladeira de ofício, não gosta de compromisso, não é de ninguém, mas é chegada num lancinho. A música gruda. Ainda não tenho distanciamento suficiente para dizer se deixa sequelas irreversíveis. Só sei que ela não anda, ela desfila. Ela é top, capa de revista. É a mais mais, ela arrasa no look. Tira foto no espelho pra postar no Facebook.

Imagem

Do outro lado, o funk melody do jovem que adapta algumas letras explícitas para frequentar os espaços censurados, falando besteiras no ouvido até fazer “pirar”. Profusão de erotismo saindo pelos poros, os verbos e o ritmo ditam a cadência sexual: tirar, enlouquecer, lamber, tocar, beijar, arrepiar, meter, melar. O que o difere do Mr. Sempre Pronto Aqui Pra Você, aquele do chip? O “novinho” se permite as fantasias com uma pessoa que lhe parece especial. A mulher deixa o status de produto a ser consumido e adquire humanidade. São homem e mulher cúmplices no vínculo que os une (não importa o tipo nem o tempo), cúmplices também nas peripécias lúbricas com ou sem vodka, uísque, água de coco, chantilly ou chocolate.  Você me faz tão bem. Uh!!! Me diz o que é que tem. Você me faz tão bem .

Imagem

Continuar lendo

Categorias: Crítica, Cultura, Sociedade | Tags: , , , , | 2 Comentários

Poeta convidado: a arte de Rogério Marcus


Rogério Marcus

Rogério Marcus

.Rogério Marcus é desenhista formado pela UFMG. Usa a poesia, o cartum e os quadrinhos como forma de expressão. Acredita na arte como meio e não como fim. Amante do pós-punk e do pop dos 80, produz o evento Decades, que a cada dois meses revê esses estilos na Casa Cultural Matriz, em Belo Horizonte. Sua queda pelo denso e o obscuro também se estende a alguns estilos do metal, sem descuidar da MPB e do eletrônico. É espiritualista aberto a recaídas niilistas. Politicamente, social-democrata. Profissionalmente é um artista, mas seu hobby é o funcionalismo público.

.

.

.

.

Carlos Alexandre

Algo morreu entre eu e os meus amigos

Que não quiseram saber

O que fizeram com você

Algo morreu entre eu e os meus amigos

Que disseram que você

Não queria trabalhar

Algo morreu entre eu e os meus amigos

Que não souberam que você

Ainda ouvia o trem passar

Algo morreu com um ano e oito meses

Mas são ditas tantas vezes

Tantas coisas tão boçais

Algo morreu e eu me senti mais sozinho

Não tanto quanto você

Naquela foto aos três aninhos

Alexandre,

Carlos Alexandre…

Alma em sangue

Carne e alma em sangue…

Alexandre,

Carlos Alexandre…

Os enxames

Calem os enxames…

Desligar

Se o coração precisar desabafar

Lembre-se que os amigos estão aí.

Se o coração precisar desabafar

Esta chamada está sendo encaminhada.

Se o coração precisar desabafar

Não se encontra no momento.

Se o coração precisar desabafar

Essa bebida contém quarenta por cento

Se o coração precisar desabafar

Não ligue ainda, junto com a faca vem

Se o coração precisar desabafar

Seremos sete bilhões em

Se o coração precisar desabafar

Seu blog visita o meu também

Se o coração precisar desabafar

Esta chamada está sendo en

Se o coração precisar desabafar

Os ciliados se movem por filamentos

Se o coração precisar desabafar

As forças geológicas levaram quatrocentos

Se o coração precisar desabafar

Esta chamada está sendo encaminhada.

Se o coração precisar desabafar

Esse medicamento provoca sonolência

Se o coração precisar desabafar

As confusões desse tira pra lá de

Se o coração precisar desabafar

O acidente envolveu cinco carros e

Se o coração precisar desabafar

Esta chamada está sendo encaminhada.

Esta chamada está sendo encaminhada.

Esta chamada está sendo.

Se o coração precisar desabafar

Aqui, eu preciso desligar.

Bioluminescência

Mote: “Não há inspiração na calmaria…Esse é vc.”

D.

“It will grow back like a starfish” – (Antony And The Johnsons)

Na penumbra, mergulhadas,

Duas criaturas atreladas gentilmente.

Aquarelas de pele mesclando vão

Duas mãos, dois muitos tons diferentes

Que surgem luminescentes,

Os da minha pele e a de

Da sua pele.

E há inspiração, sim, na calmaria,

E canto enfim a sua alegria

E, finalmente, a minha.

E nessa calma nadam olhos, mãos

E sons na penumbra vão,

Nadando no ambiente,

Os sons sob a minha pele segunda

Livres dos destroços de um tão-frágil

Que me afunda em distorção,

Os sons que são a minha alma de verdade

E nessa calma vão,

Os sons de cristal de sob a minha pele

E os de,

Da sua pele

Que se mesclando vão.

E há inspiração, sim, na calmaria,

E canto enfim a nossa calma

E finalmente, a alegria.

Acho tua boca,

Lar de tanto nunca e tanto não.

E teus olhos luzem na escuridão,

Bioluminescentes,

Onde sisuda fria vã teoria

Previa a vida sem condição.

E nessa alegria há inspiração

E o fundo dito maculado,

Envenenado em sua essência,

Brilha, suave, iluminado, filtra

Tanta dor e corrosão.

Na treva naufragada de um navio,

Criaturas iluminam o salão.

E há, sim, transmutação

Dos elementos que não são

(Embora nisso insista a escuridão),

Em sua essência, a treva

E o veneno do acidente

E luzem sendo mais que o ambiente,

Maiores que a situação, e encontrar-se vão

A formar a solução luzente.

Luzimos junto aos restos do acidente

Onde a vida declarada impossível, ausente,

Num copo pousa um trago fluorescente.

E há inspiração, sim, na calmaria,

E canto enfim e mostro a minha alma

E alegria, sou amor, sou gratidão,

Sou, finalmente, sou

Bioluminescente.

O salão da rainha

Eu fui de preto e não pude entrar

No salão da rainha.

O salão da rainha é branco.

Eu fui de branco e não pude entrar

No salão da rainha.

O salão da rainha é negro.

Melhor não dizer

Pra não ser barrado outra vez,

Mas – cá entre nós –

Só eu vi,

Entre todos os convidados,

De branco e de preto,

Que o salão da rainha

É xadrez?

Categorias: Sociedade | Deixe um comentário

MPP & Roque Tuga, para iniciantes… (um texto para degustação musical)


Já não é de hoje que sou um entusiasta da cultura lusitana. A forma como encaminho é simples de entender. Me vejo como óbvio produto, dentre outros fatores, determinantemente, da cultura e da história desse povo. Sendo alguém que estuda a cultura de língua portuguesa com intensidade, pela literatura e, ainda mais, pela língua, essa identificação é ainda mais pulsante. É meio a relação que tantos professores, sobretudo, de língua estrangeira acabam por estabelecer com o país com cuja língua lidam tão intimamente.

Feito o necessário preâmbulo, vamos à temática deste texto. Pretendo partilhar com vocês meu encantamento pela música portuguesa. Mas não vou me dedicar ao cancioneiro mais tradicional luso, ou seja, o fado e outros artistas que revisitam esse estilo vão ficar um pouco à margem aqui. O que pretendo trazer à baila é a cena daquilo que, afetuosamente, chamo de MPP (“Música Popular Portuguesa”) e o roquenrol portuga (ou como eles próprios chamam, muitas vezes, “tuga”). Trata-se, portanto, dum texto pra ser ouvido, sem nenhuma pretensão de aprofundamento crítico. Entre o céu e a terra, há muito mais em Portugal além do fado*.

Em tempo, tentarei lincar vídeos com letra, sempre que possível, já que sei, embora considere sinceramente estranho, da dificuldade que muitos dizem ter em entender o português lusitano. Também quero deixar claro que o painel aqui montado acompanha minhas referências pessoais, ok?

Bem, não se fala da cena musical portuguesa nos últimos anos, sem se trazer pra esse palco o Madredeus, banda encantadora de difícil classificação, quanto ao estilo musical. São composições baseadas em instrumentos clássicos, arredondadas num vocal poderosíssimo de Teresa Salgueiro (até 2008) e de variadas cantoras depois, sobressaindo Beatriz Nunes. A alma da banda é o músico Pedro Ayres Magalhães, grande responsável pela sonoridade/instrumentação e único ininterruptamente presente em todas as formações do grupo. O som do Madredeus é emblemático, marcante e muito característico, sendo resultado do confluir de música erudita, da tradição musical portuguesa e da contemporânea música popular. E, ainda que seja exemplo batido, a belíssima canção O pastor sintetiza muito categoricamente, por sinal, a sonoridade da banda. E da nova safra, sem Teresa Salgueiro, a soberba Ecos na Catedral. Uma epifania, a música do Madredeus! Fica a deixa pro filme de Wim Wenders Lisbon Story (no Brasil, O céu de Lisboa), rodado em homenagem ao centenário do cinema e com trilha sonora integralmente composta pelo Madredeus, que resultou no álbum da banda Ainda.

Claro que não se pode falar de música popular portuguesa deixando de lado Zeca Afonso, cuja canção Grândola Vila Morena tornou-se a senha para a tomada dos quartéis e derrubada do regime fascista em Portugal na Revolução dos Cravos, em 25 de abril de 1974, permitindo novos tempos para Portugal e suas (ex)colônias em África. Na mesma linha de “canções de intervenção”− que é como os tugas chamam o cancioneiro de protesto social− cito também José Mário Branco e, pra exemplificar sua produção, Eh! Companheiro. Nessa mesma seara ainda cabe Sérgio Godinho, apontado por alguns como o “Chico Buarque português” (pessoalmente, acho uma bobagem essas comparações), “título” que “disputa” com o próprio Zeca Afonso. Destaco de Godinho esta belíssima pérola: O primeiro dia!

Ah… mas há um roque portuga muito bom! A banda talvez mais representativa disso seja o Xutos e Pontapés, que, inclusive, dividiram palco no último Rock in Rio com os Titãs− isso fora, é claro, as apresentações no Rock in Rio Lisboa. O Xutos é de 1978 e tem 12 álbuns. São já veteranos do roquenrol, mas muito ativos ainda. Das inúmeras possibilidades, escolhi Homem do Leme, como cartão de visitas. Transitando entre o roque e uma canção de ares mais populares, temos Jorge Palma, nome destacadíssimo da música portuguesa com dezenas de álbuns lançados desde 1972. Bom exemplo do roque de Palma é esta regravação do Xutos, Esta cidade; já de sua canção mais “MPP”, Encosta-te a mim, cujo clipe mostra dezenas de outros músicos portugueses.

No plano das sublimes delicadezas, não se pode ignorar Márcia (Márcia Elizabeth Barbosa, mas só usa artisticamente o primeiro nome). Já ouvi de alguns brasileiros que é muito difícil entender o que ela diz. Enfim, como tenho o ouvido já experenciado, não consigo perceber isso. Ouçam esta lindura, com J.P. Simões, seu parceiro habitual: A pele que há em mim. Ainda nesse campo das ternuragens, há de se dar atenção ao Mob of God, banda que faz um roque voraz, majoritariamente em língua inglesa. Mas aqui trago uma improvável− porque é muito levinha pro estilo geral deles− canção da banda em português, Ao passar.

Não posso encerrar esse texto “apresentativo”, sem tocar em três nomes encantadores e fundamentais da cena musical tuga. Primeiro, Pedro Abrunhosa, com seu potentíssimo vocal e seu repertório melancólico, bem ao estilo da alma portuguesa (é só pensar nos fados!). O clipe de Quem me leva os meus fantasmas, além das belas canção e letra, ainda faz a denúncia do estupendo aumento do número de moradores de rua em Portugal, por conta da crise que varre a outrora ilusoriamente estável União Europeia. Ah! E uma de minhas melhores descobertas dos últimos tempos: Tiago Bettencourt, que tem tantas composições tão belas, tão sentidas, com tanto ressonar na alma. Caminho de voltar é uma dessas pequenas preciosidades. Talvez seja tão lírico por ser um filho da melódica data de 25 de abril. Um dos bons novos nomes da musicalidade lusitana. E, por fim, uma banda que é muito roquenrol, com guitarras pesadas, teclado mais vivaz, bateria bem representada e um vocal bastante performático, o Amor Electro. Da banda, trago A máquina, numa versão menos pesada do que a de estúdio, mas com a vantagem da letra no vídeo.

Claro que não toquei aqui numa série de boas referências. Ficam mais algumas dicas de nomes da música portuguesa: a maioria da atualidade e um mais clássico, pra não dizer que não do fado enfim. Rui Veloso, com suas canções de perfurar a alma e sua guitarra (como se denomina violão lá na terrinha) suave; Mariza, “cantadeira” de fado, nascida em Maputo, Moçambique, a banda Clã, com seu roque levinho, de pegada muitas vezes romântico, francamente, pop, o Sétima Legião, outra banda de pegada mais pop, com boas referências em suas letras, desde o nome da banda (a legião romana enviada para a colonização da Luzitânia) e, o nome que, possivelmente, é sinônimo de fado no séc. XX, Carlos do Carmo. E, pessoal, etc, etc, etceteramente…

É isso. Que tenha sido um bom texto pra se ouvir. Se te apetecestes do texto e das canções, sugiro investigares mais sobre os artistas, além de ouvires outros vídeos a eles associados.

* Essa frase foi sugerida pela parceira de pré-leituras, de carinhos e de sonhos Andrea de Oliveira.

P.S.: a qualquer hora dessas, um texto sobre roque de lugares verdadeiramente exóticos. Já ouviu falar de banda de roque da Groenlândia? E de Cabo Verde? Da Palestina, talvez… E roque indígena norte-americano?!

Imagem

Categorias: Crítica, Cultura | Tags: , , , , | 3 Comentários

Meritocracia plutocrática


“Há meios que supostamente cumprem a função de informar, mas quando dependem de grupos econômicos poderosos, o que fazem é dirigir a cidadania em função dos seus interesses”.

Laurindo Leal Filho

 

O jornal O Globo é o pai da mentira. Ele tentou enganar os nossos ancestrais e continua tentando enganar de toda forma, maneira e feitio. Tende cuidado com O Globo, vosso adversário, pois ele anda ao redor de vós, bramando como leão, buscando a quem possa tragar. Resisti-lhe. Tornai-vos vitoriosos sobre ele e suas mentiras.

Image

Charge de Claudius

A Rede Globo faz uso de seu poder de monopólio da informação contra o ENEM. São milhões de redações corrigidas e recorrigidas, mas se alguma falha for detectada é o suficiente para as Organizações Globo metralharem a credibilidade do processo.
O PLIM PLIM ataca o ENEM porque é contra qualquer projeto de inclusão social que tenha origem trabalhista. Mostra claramente, por meio de seus editoriais, sua contrariedade em relação às cotas raciais nas universidades públicas. Sua ideologia do livre mercado tem como princípio a meritocracia plutocrática e a não intervenção do Estado na economia.
Qualquer governo de origem trabalhista terá que enfrentar a oposição dos oligopólios da mídia empresarial. Até hoje, nenhum governo teve a coragem de sofrer o desgaste político desse enfrentamento. Somente uma sociedade organizada e ciente da importância da democratização dos meios de comunicação poderá mudar o horizonte sufocante do monopólio do discurso.

O ENEM foi criado com o objetivo de avaliar o desempenho do estudante ao fim da educação básica, buscando contribuir para a melhoria da qualidade desse nível de escolaridade.

A partir de 2009 passou a ser utilizado também como mecanismo de seleção para o ingresso no ensino superior. Foram implementadas mudanças no Exame que contribuem para a democratização das oportunidades de acesso às vagas oferecidas pelas universidades, para a mobilidade acadêmica e para induzir a reestruturação dos currículos do ensino médio.

Respeitando a autonomia das universidades, a utilização dos resultados do Enem para acesso ao ensino superior pode ocorrer como fase única de seleção ou combinado com seus processos seletivos próprios. O exame também é utilizado para o acesso a programas oferecidos pelo Governo Federal, tais como o ProUni.
Quando o Enem passou a substituir a indústria do vestibular e servir como prova de acesso à graduação em diversas universidades federais em todo o Brasil, a família Marinho passou a atacar o exame logo ao despontar da manhã. Uma coincidência muito apreciada no mundo do livre mercado.·.

A cruzada global da meritocracia plutocrática contra o ENEM ganhou munição em 2011 pela ocasião do vazamento de algumas questões para um colégio particular em Fortaleza. As Organizações Globo fizeram pressão para que o exame fosse anulado. Confira nas seguintes manchetes da época:

“Estudantes organizam protesto contra problemas no exame”

“Estudantes organizam protesto pelo Facebook contra problemas no exame”

“Alguns candidatos cariocas querem anulação total, e outros ameaçam processar o MEC”.

“Veja algumas das questões vazadas que foram parar na internet”

“MEC confirma que as 14 questões que vazaram foram copiadas de pré-teste”

“Professores acham que exame exigiu conteúdos mais específicos”

“Histórico de problemas desde a mudança de formato em 2009”

Na redação de 2012, após a estultice do garoto miojo, o jornalão volta à linha de frente:

“Professores pedem anulação de questões”

“Estudantes usam Facebook para contestar redações do Enem”

“Estudante que incluiu receita de miojo na redação do Enem 2012: ‘Era para tirar zero’”

Enem 2012: estudante escreve receita de miojo na redação e recebe nota 560

Falhas na correção de redações do Enem viram ‘meme’ em redes sociais

 “Estudantes ficam surpresos com tema da redação

Márcio Hilário, professor de Língua Portuguesa do Colégio Pedro II, deu uma breve aula expositiva aos editores do jornal da Família Marinho, como se fossem garotos de dez anos de idade, na perseverança de que na próxima vez aprendam que, quando se está alheio ao assunto, a única coisa decente a fazer é abster-se de falar. Ao menos passem a bola para quem sabe chutar.

“As organizações Globo não se cansam de tentar acabar com a credibilidade de um exame que mudou a perspectiva educacional brasileira… para MELHOR, diga-se de passagem. Os recorrentes exemplos garimpados pela imprensa representam a exceção da exceção, mas são passados como se fossem regra geral. Em um concurso com milhões de candidatos, assim como em qualquer política pública de larga escala, certos equívocos não só são possíveis, como são naturais e saudáveis dentro da diversidade humana. Afinal, não estamos diante de uma ciência exata, até mesmo porque nem isso existe.

O fato de o candidato ter inserido um parágrafo que foge ao tema não implica a anulação da redação. Se desconsiderarmos este parágrafo em especial, ainda assim teríamos o número mínimo de linhas para que o texto fosse corrigido na íntegra. Ele seria apenado, mas não anulado! O problema é que o pensamento reacionário dominante, manifestado inclusive por pessoas que não têm competência para escrever uma linha aproveitável que seja, sugere imediatamente a anulação do texto. É preciso lembrar que estamos falando de um concurso de acesso e que, portanto, felizmente ele tem uma natureza inclusiva. Difícil é essa mídia golpista, elitista e reacionária engolir isso. Pior ainda são as pessoas darem eco ao que não compreendem.

É interessante que supervalorizem determinados aspectos da língua portuguesa como se eles fossem os definidores mais importantes do caráter de alguém. Como bacharel, licenciado, mestrado e doutorado em Letras, mas, sobretudo, como professor, digo uma coisa simples: prefiro que alguém tenha menos ortografia e mais o que dizer; menos educação formal e mais caráter; menos requinte e mais engajamento.

Falam do ENEM como se ele fosse o responsável pelo colapso da educação brasileira. Mostram-se indignados com a ascensão dos pobres como se os ricos formados nas mais caras escolas de ensino médio fossem o suprassumo da sapiência. Coitados, são, na verdade, ignorantes bilíngues; alienados globais; almas vazias com roupa de grife. Tornam-se depois profissionais desumanos, diplomados acéfalos, bacharéis frios e mercantis.

O verdadeiro colapso da educação brasileira sempre foi a exclusão social que marginalizou nosso povo e privilegiou um pequeno grupo. Às elites, interessa que tudo continue assim, é claro! Afinal, a fórmula dá certo!!! Só para poucos, claro, mas dá certo!!!”

Para terminar, mais uma  ilustração da legitimação das Organizações Globo como veículo da meritocracia plutocrática. Apenas algumas pinceladas de seu editorial de 14/01/2013 contra as cotas raciais nas universidades públicas:  http://oglobo.globo.com/pais/noblat/post.asp?cod_post=482222&ch=n

“Se ela nascer “negra, parda ou indígena”, terá facilitado o ingresso no ensino superior público.”

 ”… a sua vida dependerá bem menos do esforço próprio do que de contingências de misturas de DNAs…”.

“Caso não tenha a sorte de ser “negra, parda ou indígena”, precisará contar com uma improvável fonte de renda para financiar o estudo num estabelecimento escolar privado ou tirar a sorte grande de obter alguma bolsa”.

“… provavelmente para desgosto de racialistas mais radicais”.

“… a contaminação da qualidade do ensino superior pelo ingresso de estudantes mal preparados”.

“Sob a ação de lobbies, preferiu-se a solução politicamente correta e demagógica das cotas raciais…,”.

 

 

Categorias: Crítica, Mídia, Política, Sociedade | 4 Comentários

Amána*


Tinha, até quinta-feira, planejado um texto sobre dado assunto, já estruturado na cabeça e com trechos já alinhavados que versaria acerca duma temática que me é muito cara. Contudo, o dia de ontem me impôs nova pauta. Afinal, não há como ficar indiferente ao ato de brutalidade perpetrado pelo governo do estado do Rio de Janeiro contra os indígenas que ocupavam o prédio histórico do Museu do Índio. Agora, o espaço será um imóvel para as olimpíadas ou um estacionamento ou sei lá o quê. Tanto faz… os investidores do “banco imobiliário” carioca exultam por mais um dever de casa exitosamente cumprido por seu promissor menino.

Enquanto isso, o Secretário de Esportes do estado do Rio de Janeiro, cujo nome a ninguém interessa, creio, afirma: “índio mesmo mora na floresta”. É uma afirmação que nos leva ao silêncio, não?!

Bem, feito o constrangedor e necessário silêncio reflexivo, venho tentando, mesmo ancorado à conjuntura, dar mais atenção à estrutura em meus textos, especialmente a ideológica, que recobre amplitudes largas e expressivas de nosso mundo, óbvio. Assim, por mais que me sinta tentado, não pretendo aqui me dedicar à análise da ação filhadaputesca, torpe, brutal, truculenta, selvática promovida pelo desgovernador do estado, cujo nome, em respeito a seu pai (embora vascaíno), figura pela qual sinto vergonha alheia e solidária neste momento, não trarei para sujar este texto que, em si, já tratará de manchas muito sentidas.

Oswald de Andrade dissera que

Quando o português chegou

Debaixo de uma bruta chuva

Vestiu o índio

Que pena!

Fosse uma manhã de sol

O índio tinha despido

O português.

Sagazmente intitulado Erro de português, esse texto se refere ao acontecimento que iniciou o infindável dilúvio na vida dos povos indígenas, que tudo perderam: sua diferenciação, sua história, sua terra, sua condição humana. Sejamos francos, em nosso país, índio não é nada; é menos do que gente, sequer indigente! Penso que, mesmo na América banhada pelo Oceano Pacífico, onde a escravidão foi indígena com repercussões sociais muito semelhantes às verificadas na América Atlântica, em relação ao escravo africano, a situação não é do apagamento humano (algo duma ordem mais profunda do que o apagamento social). Índios não são, no Brasil, gente nem cidadãos e sequer brasileiros, a rigor, por mais doído que seja admitir isso.

No encerramento das Olimpíadas de Londres, durante a apresentação da cidade sede dos próximos jogos, o Rio de Janeiro, os índios estiveram presentes, emergindo da escuridão, com cocares luminosos em verde fluorescente, quebrando as trevas plenas. ASQUEROSA HIPOCRISIA! Pra quem não viu ou não se lembra: http://www.youtube.com/watch?v=HgKCO-sfab8. É a mesma velha cretinice de romantizar o índio enquanto segue, inclemente, seu extermínio.

Em 1530, quando efetivamente se iniciou a colonização portuguesa no Brasil, estima-se um número, necessariamente impreciso, de 4 a 5 milhões de indígenas em nosso território. Hoje, eles sequer somam 500 mil habitantes. A população brasileira cresce exponencialmente ao longo dos séculos e, dentro dela, a indígena diminui tão acentuadamente?! Hoje são 225 etnias com 180 línguas. Um massacre! Algumas línguas não devem sobreviver nem até o meio deste século, pois muitas são faladas por menos de uma centena de pessoas. Há situações extremas de idiomas falados por pouquíssimas dezenas de indígenas. Um idioma morre junto com uma cultura, com uma forma peculiar de se ver o mundo, com um povo.

Nosso desprezo pelos índios é tamanho e expresso tão categoricamente, inclusive, em termos sócio-discursivos, que fez até do negro homem branco. São, em nosso país, assassinados dia a dia e contam ainda com uma irônica espécie de “concessão” para aqui viverem. Não que não haja exemplos similares em outros países. O caso dos EUA é tão emblemático quanto o nosso. Lá, onde os preconceitos são mais à flor da pele, houve guerra aberta aos índios que também vêm sendo avassaladoramente extintos. Desde 17 de dezembro de 2007, os Sioux declararam independência dos EUA pelo não cumprimento do tratado de 1868 de preservação de reservas e cultura indígenas da, assim chamada, Grande Nação Sioux. Obviamente, os norte-americanos ignoram tal ato de autodeterminação indígena. Ou seja, não se trata simplistamente dum gesto brasileiro, mas duma visão eurocêntrica que temos profundamente arraigada. Os portugueses a quem creditamos, prosaicamente, todos os desmandos in terra brasilis somos nós mesmos. Claro que o mesmo raciocínio é extensivo a outros povos colonizados pelos europeus, esse povo avançado, moderno, glamuroso, saqueador e assassino (contradições, sempre elas…). A esse respeito o processo tardio de colonização das terras da Oceania pelos “tão exemplares” ingleses que o diga. O destino dos aborígenes australianos se cercou das mesmas densas nuvens que nublaram irreversivelmente a vida de todo e qualquer povo nativo americano desde Colombo. Os povos aborígenes, em franca extinção, de todo o canto valem menos do que os respectivos animais em situação semelhante. E quem vos fala isso tem marcada afeição pelos animais, mas, sobretudo, pelo ser humano. Ocorre que o convívio do ser humano com o ser desumano vem sendo um confronto desigual e covarde.

Não cabe na civilização capitalista a existência de indígenas. Curto e grosso, simples assim.

*Amána: palavra nhengatu que significa chuva. O nhengatu é uma das muitas línguas do tupi, que é um tronco linguístico, não uma língua em si. O tronco tupi, por sua vez, compõe a família linguística tupi-guarani. O nhengatu já foi a língua mais falada do Brasil, recebendo o status de língua geral. Era a língua de comunicação cotidiana (essa informação foi devida e totalmente apagada da história de nosso país), até, pasmen, meados do séc. XVIII, quando por decreto do Marquês de Pombal o português foi elevado à força à categoria de língua nacional. O nhengatu se tornara língua proscrita, proibida de ser utilizada, criminalizada. Hoje, no Brasil, há apenas cerca de 3000 falantes dessa língua e, no continente, mais uns 5000.

Deixo, por fim, uma reflexão do Midnight Oil, que é uma banda australiana que, embora rotulada, comercialmente, como surf rock (sabe-se lá o que isso significa?!), é das bandas com letras mais politizadas que conheço. As lutas aborígenes australianas frequentam ostensivamente suas canções. Peter Garrett, vocalista e compositor da banda já recebeu de diferentes nações aborígenes o título equivalente ao que seria um cacique. Ativista, com a mesma bandeira de defesa desses povos e militante da causa ecológica em geral, ele foi eleito senador australiano em 2007 pelo Partido Trabalhista Australiano. A música seguinte chama-se Warakurna, nome de uma etnia aborígene e toca em questões que valem pra todos povos nativos colonizados em todo o mundo. “This land must change or land must burn”! Composição de Peter Garrett, Jim Moginie e Rob Hirst.

There is enough for everyone

In Redfern as there is in Alice

This is not the Buckingham Palace

This the crown land

This is the brown land

This is not our land

Some folks live in water tanks

Some folks live in red brick flats

There is enough, the law is carved in granite

It’s been shaped by wind and rain

White law could be wrong

Black law could be strong

Warakurna, cars will roll

Don’t drink by the water hole

Court fines on the shopfront wall

Beat the grog and save your soul

Some people laugh, some never learn

This land must change or land must burn

Some people sleep, some people yearn

This land must change or land must burn

Diesel and dust is what we breathe

This land don’t change and we don’t leave

Some people live, some never die

This land don’t change this land must lie

Some people leave, always return

This land must change or land must burn

Warakurna, camels roam

Fires are warm and dogs are cold

Not since Lassiter was here

Black man’s got a lot to fear

Some people laugh, some never learn

This land must change or land must burn

Some people leave, always return

This land must change or land must burn

Imagem

Categorias: Cultura, Política, Reflexões, Sociedade | Tags: , , , | 1 Comentário

Da série: quantas vidas vivendo por aí


Ana Souto*

Dignidade não se barganha

Dignidade não se barganha

Ontem esperava, na calçada da Av. Paulista, a abertura das bilheterias do Itaú quando um catador de latinhas dispara na minha direção: “ A liberdade está um caos!!”. Sou atingida em cheio pela potência poética da declaração, é claro. Peço mais esclarecimentos. Ele fala do apagão de semáforos no Bairro da Liberdade, com direito a acidentes, logo emendando com um “ E o Haddad, hem?” , para em seguida, em acelerado monólogo crítico ponderar, entre outras coisas “mas eu acho que é sabotagem, sabe? Essa coisa da política é um nojo, né?”. Comento que ele parece bem informado. Me diz que tem Segundo Grau, gosta de ler, lê tudo que cai na sua mão, andou nas drogas, há um ano e meio está livre. Eu pergunto: limpo? Ele ratifica “ livre”! Para em seguida contar que esteve preso por dez anos, apressando-se em me tranquilizar: não, nunca matou ninguém. “ Naquele tempo a gente roubava tape de carro, corrente de ouro, essas coisas”.Esqueci de dizer que a cada final de frase dava uma gargalhada, deixando à mostra as falhas dentárias, à direita, na arcada superior. Dava uma declaração e gargalhava “ Depois fui preso, cumpri dois anos, saí”. Gargalhada. “ Os amigos vinham e falavam no ouvido, né, vamos ali e tal.” Gargalhada. “ Já fui escriturário, nem existe mais essa função, né? Agora cato latinha”. Pergunto se não gostaria de voltar aos escritórios, não tem mais escriturário mas tem assistente administrativo, o que dá no mesmo, “Meu tempo já foi, tenho 46 anos, eu cato latinha, moro numa pensão, não entendo nada de computador, essas coisas”. Comento que parece saudável e nem aparenta a idade que tem. Dez anos na cadeia é muito tempo, hem? Suspeito que mentiu sobre a gravidade de seus delitos, desconfiada crônica que sou. “ Eu sempre fui bonitinho. Aí você estava lá, chegava na cadeia e o negão falava: vai ser boneca, chega aqui boneca. E você tinha que dar umas pauladas no cara, né? Vinha o juiz e dava mais uns aninhos”. Gargalhada.” Não tenho nada contra gay, ser gay, os negros, mas eu não… aquele tempo a cadeia era uma bagunça, não tinha organização nenhuma, era cada um por si e o diabo pra todos, né?” Gargalhada. Ponho mais atenção no aspecto roupa. Limpa, camisa dentro da calça, barba feita. Não escapa aos seu olhar arguto. “ Se a gente não tiver auto-estima vai para o buraco, né?” Concordo que é um bom começo embora não resolva tudo. Então me conta mais alguns episódios da cadeia e das íntimas relações entre amizades, drogas e “ falta de entendimento”, como ele diz. Depois pergunta se o espetáculo  é grátis e declara que vai assistir outro dia. Na despedida, nos apresentamos. Já quase na esquina, grita “ Foi bom conversar com você!”. Tenho vergonha de responder aos berros, só aceno, mas queria ter dito que a recíproca foi verdadeira, Marcelo.

Ana Souto é andarilha desde que Portugal entrou na sua vida, duas gerações atrás. Ama o campo da educação, a política e suas lutas, as ciências,o teatro, as artes e as gentes. Na práxis, vende ou dá o que lhe vai na cabeça, e sobrevive.

Transversos reserva as sextas-feiras para a publicação de textos de nossos colaboradores. E para um bom vinho. Não necessariamente nessa ordem. Visite nossa página do Facebook. Colabore. Deixe seu texto. Ou vinho. Apenas desconfie do que seja trivial.

Categorias: Sociedade | Deixe um comentário

Meu nome é Legião, respondeu ele, porque somos muitos


Meu nome é… você sabe.

Enquanto reflito a multiplicidade de destaques da última semana, busco neles um ponto de convergência no olhar de quem atônita observa as nuances de uma mesma questão. Em postagem recente no facebook, falei sobre tolerância religiosa e fui tomada por alguns amigos leitores como a crédula que não sou. A réplica de uma pessoa querida que navega em outros mares para além do Atlântico foi tão sensacional que me comprometi a publicá-la. Sai – me parece – na próxima semana*.

Estimulo a curiosidade interlocutora para as próximas postagens do blog e volto ao mote que me trouxe a pensar nessas linhas. O que teriam em comum os assuntos a seguir: tragédia das chuvas em Petrópolis, novas declarações de Marco (In)Feliciano, escândalo nas redações do ENEM e trote racista e sexista na Faculdade de Direito da UFMG?

Com todo respeito aos avanços atingidos pelos últimos governos no que tange a algumas importantes questões nacionais como a política de inclusão social e a política de transparência no acesso às informações, fica a pergunta: por que, presidenta, culpar as vítimas pela própria miséria? O que seriam afinal as “tais medidas mais drásticas” para evitar que as pessoas fiquem onde não podem ficar? É como um analgésico: cuida-se do sintoma sem que a doença seja tratada. Isso mais uma vez faz lembrar a política excludente das remoções, já abordada no artigo Miss Liberty, de Moacir de Sousa. (https://transversos.wordpress.com/2013/03/18/miss-liberty-em-vila-kennedy/). Alguém pode se arriscar a perguntar: mas a vida não é o mais importante? Sim, a vida DIGNA é o mais importante e, numa hora dessas, o adjetivo não tem nada de adjunto.

Já a mais nova estopada infeliciana foi a declaração de que os direitos da mulher ferem os da família, que o lugar dela é em casa, sendo mãe e cuidadora da prole,  que a igualdade de gênero vai de encontro ao estabelecimento de uma sociedade ordeira. E que a prole seja de preferência numerosa, né? – adendo meu. E adepta da religião dele, na congregação dele de preferência. Haja dízimo! Haja ofertório! Só faltou dizer que mulher só precisa contar até seis. Nem vou dizer o porquê, pois se trata de uma piadinha machista infame. Defendo até meu último minuto de vida o direito que o Infeliciano tem de pensar e expressar isso. O problema mesmo é alguém como ele ocupar o lugar que ocupa na política e no cenário nacional. Eu era quase feliz quando nem sabia que ele existia. A última notícia que li ontem falava de uma possível renúncia. Será que tantas críticas entoadas por tantas pessoas, inclusive ateus, ganhou status de prece diante de – quem sabe? – deus?

E o ENEM, hein? Que vergonha! É realmente infame que profissionais se considerem especialistas em áreas diversas daquelas a que se dedicaram apenas para apresentar uma distorção dos fatos. E tome-lhe PIG nas cabeças! Acho importante discutir critérios de avaliação. O problema é que os jornais têm se arvorado esse direito, conduzindo as pessoas ao reforço da execração do ENEM, do MEC, do governo, da banca e, por extensão, dos professores (que, afinal, são esses os profissionais que compõem as bancas) sem sequer ter a devida atenção com as competências analisadas e os casos de atribuição de nota zero. Pergunto uma coisa: qual foi o jornal que divulgou a grade de correção? Qual foi? Não vi nenhum. Taquil! Destinam umas poucas linhas a alguma justificativa do MEC e em contrapartida 90% da matéria fica por conta das generalizações capazes de sensibilizar grande parte da população, que é, sim, falante da língua portuguesa, mas não tem conhecimento técnico para julgar critérios de avaliação de produção textual.

 Last but not least, o episódio do trote na Faculdade de Direito da UFMG expõe o horror que se procura jogar para baixo do tapete. Não, não somos um país cordial. Nossa verve excludente, classista, machista, racista nos atropela a todo instante em todo lugar. O trote e a saudação nazista de futuros juristas apontam o que está em toda a extensão deste artigo – na transformação das vítimas em culpadas, na ocupação de cargo público por gente não qualificada, na depreciação sistemática de algo que não se entende -, ostentam o inescapável, o que nos espreita em cada esquina, cada escola, cada igreja, cada casa: a inegável proximidade da barbárie, muitas vezes simbólica, mas sempre barbárie. Para quem não acredita no retorno do pior, inquiete-se um pouco mais com o trailer do genial filme alemão Die Welle (A Onda), de 2008.  Há várias formas de se deslegitimar o outro: estigmatizá-lo para depois torná-lo o estranho a ser combatido tem-se demostrado a mais eficaz delas.

*https://transversos.wordpress.com/2013/04/05/religiao-simbolico-e-intolerancia/. Publicado em 5 de abril de 2013.

Categorias: Crítica, Mídia, Política, Sociedade | Tags: , , | 7 Comentários

Os filhos do silêncio


Foto - Sebastião Salgado

Foto: Sebastião Salgado

Muito antes de aprendermos nossa língua pátria, já não falávamos em nossa não língua mátria. Nascidos dos ventres do silêncio, os quais nos carregaram mudos em nossas caladas gestações, nunca escutamos como fomos fecundados, porque também isso não nos foi dito. Calamo-nos quando das palmadas das parteiras, dos golpes do destino, das pancadas da vida e dos açoites do tempo. O não dizer é tudo com que nos comunicamos desde antes de nascermos para um mundo dominado pela palavra.

Nosso silêncio fez mais do que nos calar a boca, encurtou-nos os gestos, atrofiou-nos o movimento, ressecou-nos a boca, apagou-nos os olhos, matou-nos a alma. Na terra dos incansáveis oradores, fomos educados, enfim, para ter as orelhas baixas, os olhos caídos, o peito arqueado e a espinha dobrada. Obedecemos prontamente a todos os discursos proferidos por quem acima de nós se pôs. Quanto aos outros, só lhes podemos antecipar as pisadas, enfiando-nos por entre as solas de seus sapatos e o chão.

Em nossa boca de fome, se uma língua pendente há, é para lamber-lhes as botas. Nossa falta de dentes – nascida quem sabe da impossibilidade de sorrir – é que nos impede de morder as mãos que nos desalimentam. Não podemos reagir. Não devemos reagir. Não é certo! E ademais, para que reagir se o que poderíamos dizer nunca será ouvido? O que não se ouve não se entende. O que não se entende não se aplica. E o que não é aplicado não nos restitui a voz. E sem voz e sem vez, continuaremos assim esperando… o norte, a sorte, o corte, a morte. Tudo no mais completo e absoluto silêncio… baixinho… calado… sem incomodar ninguém.

Márcio Hilário.
11-07-2012
Categorias: Sociedade | 3 Comentários

Blog no WordPress.com.